SaaSterização – os tropeços e acertos da inGaia

Por: Heitor Facini7 Minutos de leituraEm 12/12/2017Atualizado em 13/10/2020

O processo de transformação de uma empresa tradicional para o modelo SaaS é trabalhoso, requer esforço e muito empenho. Mas, no fim, é extremamente recompensador.

“Quando a gente criou a empresa, não existia SaaS no Brasil”, lembrou José Eduardo Andrade, CEO e cofundador da inGaia, empresa que produz softwares para o mercado imobiliário.

“Desde o princípio, a inGaia teve foco”, comentou Mickael Malka, presidente da empresa. “Isso é algo que todo empreendedor precisa para alcançar o sucesso”.

Eduardo e Mickael compartilharam a trajetória da inGaia na palestra “SaaSterização – os nossos tropeços e acertos” no Superlógica Xperience 2017. É uma boa forma de ter insights de qual caminho seguir na sua empresa se quiser entrar nesse mercado. Confira no vídeo abaixo:

2000: início da empresa e boom de empresas de internet

A inGaia foi fundada em 2000 pelo casal Eduardo Andrade e Camila Monteiro Andrade. “Quem vivenciou os anos 2000 sabe: a cada almoço surgia a ideia de criar uma empresa dentro da internet”, lembrou Eduardo. “Comigo e com a Camila não foi diferente”.

Nessa época não existia SaaS no Brasil. O máximo era o início da Salesforce com o modelo nos Estados Unidos. As empresas que surgiam queriam as coisas com modelo transacional comum. “Desde o princípio a gente pensou em algo que se encaixa no que é chamado economia da recorrência hoje em dia”, explicou Eduardo. “Sempre pensamos em planos de assinatura”.

Foco em imobiliárias

Na mesma época, era comum que as empresas vendessem software sob medida ou um serviço mais generalista que atendessem o maior número de segmentos possíveis. A inGaia pensava de outra forma.

“A gente sempre teve uma coisa muito importante para qualquer empreendedor: o foco”, explicou Eduardo. “Desde a nossa fundação, a gente quis ser protagonista no mercado imobiliário”.

2007: começo do modelo SaaS, crescimento da empresa e lançamento de CRM

Em 2007, a inGaia saltou de 2 pessoas (Eduardo e Camila) para 12 e o mercado começou a falar no modelo SaaS. A empresa decidiu entrar no jogo e lançar o inGaia Imob de maneira recorrente e na nuvem. Foi um dos primeiros CRMs de qualquer tipo de segmento do Brasil.

Também surgiu uma oportunidade de cross-selling. “A gente pegou os nossos primeiros 150 clientes da nossa base e oferecemos também o novo produto”, explicou Eduardo.

2010: investimento e escalamento nível Brasil

Depois de 3 anos, a empresa continuava crescendo e tinha 18 funcionários. Entretanto, não era o bastante. O objetivo era escalar a nível Brasil – mais de 5 mil municípios e 40 mil imobiliárias. “Era o momento de buscar investimento externo”, lembrou Eduardo. “Mas não qualquer investidor. A gente queria alguém que fosse estratégico, mostrasse o caminho e construísse uma história junto”.

Aí que Mickael entrou na história da empresa. “Quando eu encontrei o Eduardo, ele me disse o seguinte: ‘Eu tenho uma empresa que está crescendo de 10 a 15 clientes por mês e tenho um problema’”, lembrou. “O problema dele era que tinha 100 outros clientes querendo entrar na carteira e não tinha estrutura. Eu falei para ele: ‘Esse problema todo empreendedor queria ter’”.

Melhora na infraestrutura do sistema

Mickael entrou como investidor com o desafio de fazer com que o crescimento de 15 clientes por mês fosse de 150. O primeiro passo foi trabalhar para fazer com que a infraestrutura colaborasse para tal.

“Naquela época, tínhamos um servidor que nos dava um prazo de até 48h para resolver os problemas. Não podiamos esperar tudo isso”, explicou Mickael. “Paramos as vendas, fizemos uma nova estrutura para comportar os nossos clientes 100% online”.

Depois implementaram a metodologia ágil para que o produto seguisse o crescimento da empresa como um todo. “Um produto SaaS é como uma casa. Primeiro você pensa na fundação sólida e depois nos cômodos”, explicou Mickael.

E isso trazia um resultado prático para a empresa. “A cada problema de estrutura que a gente resolvia, a nossa receita aumentava”, explicou Eduardo.

2013: melhoria nos processos

O próximo passo, após ter melhorado a estrutura, foi o de escalar os processos. “Sem ter o pensamento SaaS e definir os processos dessa maneira, a sua vida será mais complicada”, alertou Mickael.

Por isso, foram implementadas algumas ações na maneira de conduzir da empresa. São elas:

  • Trial dos produtos;
  • E-mails de nutrição;
  • Aceites de contratos online;
  • Criação de planos de assinaturas.

Os objetivos eram aumentar o engajamento dos leads com a solução e agilizar os processos. “50% dos leads de empresas B2B já são qualificados por definição”, apontou Mickael. “Mas, se você não entender a jornada do cliente, vai se atrapalhar. Os e-mails de nutrição ajudam em achar o tempo certo de compra”.

Além disso, a melhoria nos processos fazia com que os dois pudessem focar em coisas realmente importantes naquele momento. “Eu e o Eduardo precisávamos de 1 ou 2 horas diárias só assinando contratos”, lembrou Mickael. “O processo de aceite digital melhorou muito a otimização do nosso tempo”.

Nessa época, a inGaia entrou em contato com a Superlógica para criar uma parceria que dura até hoje. Integrado ao software de gestão de assinaturas e pagamentos recorrentes, os trials foram para o ar e os clientes passaram a aceitar um termo de serviço online.

2014: impulsionamento das vendas

Após fortalecer a infraestrutura e melhorar os processos, a próxima etapa era impulsionar as vendas. “Os desafios eram tremendos. Você tem de saber precificar: não pode ser muito caro e nem muito barato”, explicou Mickael.

Nova call to action

Para isso, a inGaia implementou uma tabela de preços flexível com um time comercial também flexível. “Quando aumentamos o preço e percebemos a dificuldade de vendas da nossa equipe, conseguimos mudá-lo num espaço de tempo de no máximo 30 dias”, explicou Mickael. “Sem uma boa infraestrutura, um bom produto e processos bem definidos você nunca vai conseguir precificar da maneira correta. E a precificação é coração do seu crescimento. Sem ela, a sua empresa nunca ganhará tração e irá escalar”.

Implementação do pacote anual

“No mundo SaaS, diversas empresas têm medo de vender pacotes anuais”, apontou Mickael. “Ninguém nunca acha que o cliente vai estar disposto a pagar um valor elevado com 1 ano de antecipação. Mas no nosso caso deu muito certo”.

Hoje, 40% das vendas da inGaia vêm desse tipo de pacote. “Isso se deve à nossa credibilidade e à qualidade do produto oferecido”, explicou Mickael. “O nosso financeiro agradece”.

Entretanto, é preciso estar atento às suas métricas pois alguns indicadores vão cair. “Você tem de saber o quanto vai querer vender de pacotes anuais para não se surpreender lá na frente”, alertou Eduardo.

2015: melhora no portfólio de serviços oferecidos

Em 2015, o crescimento foi de 30%. Foi abaixo dos anos anteriores, mas ainda assim foi um crescimento. “Foi o início da crise econômica e um momento de turbulência no governo”, lembrou Mickael.

Foi a oportunidade que a inGaia encontrou para criar novos produtos e serviços para oferecer. Para isso, foi implementado um marketplace. Surgiram assim:

  • inGaia Corretor;
  • inGaia Sites;
  • inGaia Capital;
  • inGaia InCorp;
  • inGaia Campus;
  • inGaia Locação;
  • inGaia Seguros;
  • inGaia Ads.

Abrimos a cabeça e começamos a pensar em serviços que iriam ajudar no dia a dia do nosso cliente”, explicou Mickael. “De quebra, abrimos a oportunidade para que outras empresas parceiras pudessem oferecer serviços para eles”.

2016: foco em métricas

Com o crescimento saudável dos anos anteriores, o foco passou a analisar métricas para negócios recorrentes. “O objetivo era conseguir melhorar o resultado da positivo”, explicou Eduardo. Ele apresentou as métricas naquele momento (2016).

A receita da inGaia crescia 37% ao ano; o número de usuários crescia 37%; o MRR – receita recorrente mensal – aumentava 30%; a razão entre lifetime value (tempo que o cliente fica na base) com o CAC (custo por aquisição de cliente) era de 3.6x (o saudável é acima de 3x); e o churn (cancelamento de assinaturas) era de 2,8% ao mês (75% dele era involuntário, ou seja, não havia a vontade de cancelar).

Entrada de novo investimento internacional

Em 2016, foi o momento da entrada de um novo investidor também. Novamente ele veio do mercado internacional. “Sem capital você não consegue crescer”, apontou Mickael. “Esse investidor foi estrangeiro. O mercado brasileiro é diferente, lá fora existem fundos que buscam empresas SaaS”.

Na mesma edição do Superlógica Xperience 2017, Joaquim Lima (Riverwood Capital), Patrick Arippol (DGF Investimentos) e Pierre Schurmann (Bossa Nova Investimentos) discutiram o assunto no painel Investimento em empresas SaaS no Brasil – presente e futuro.

Entretanto, ele acredita que o cenário vai mudar nos próximos anos. “Eventos como o Superlógica Xperience vão vir para mudar isso. Tanto que o próximo investidor será brasileiro”, lembrou.

Foco no atendimento

Eram mais de 30 mil usuários e mais de 7 mil assinaturas naquele momento. Mas havia um problema: o CAC só subia e o lifetime value, LTV,  não acompanhava. “O coração de uma empresa SaaS sempre vai ser o atendimento. É ele que fará com que ela respire e cresça”, afirmou Eduardo.

A inGaia certificou todas as pessoas em cada etapa do processo: onboarding, suporte, customer success, treinamento e renovação. Também foi desenvolvido um sistema que premia os funcionários com base em meritocracia e gamificação. “O resultado foi fantástico! Aumentamos muito a relação entre LTV/CAC”, comentou Eduardo.

Toda a empresa tinha de ter a mesma sintonia. “Você precisa implementar uma cultura que a empresa entenda as métricas em todos os lugares”, lembrou Mickael. “Focamos nos clientes com menos de 6 meses, baby clientes como chamamos. É lá onde estava a maior parte do churn. Após 1 ano usando o sistema, quando ele engaja com a ferramenta, a chance de cancelar é muito menor”.

Cultura também foi o tema do painel “Como implementar a cultura de startup na sua empresa?” no Superlógica Xperience 2017. Participaram dele Emerson Rodrigues (Superlógica), Guilherme Junqueira (Gama Academy) e Horácio Poblete (Trustvox)

2017: conteúdo é rei

2017 foi o momento de se tornar referência em outra área no mercado imobiliário: a produção de conteúdo. “Nosso portal é um dos nossos maiores cases de sucesso”, comentou Mickael. “Hoje, 50% dos nossos leads vêm organicamente dele. Lá não somos uma empresa de software: somos líderes de opinião do setor e atraímos clientes através do inbound”.

Mas não adianta fazer simplesmente por fazer. Para o conteúdo funcionar como deve, é necessário ter qualidade. “O blog e o portal têm de ser bons e ter atualizações constantes”, lembrou Eduardo. “Para isso você precisa investir em uma boa equipe de marketing”.

Implementação da cultura SaaS

Dentro da inGaia, cada membro de cada departamento entende de métricas, do produto e do mercado imobiliário. “Todos na empresa são apaixonados por esse segmento”, explicou Eduardo. “Isso é o que faz a diferença: um time engajado e feliz”.

Entretanto, ele ressalta que cultura não é apenas missão, visão e valor. “É como você trata um funcionário, como você o deixa inovar, a sua atitude no dia a dia, quem você é dentro do escritório. Cultura é o que você faz e como reflete isso para o resto da empresa”, afirmou.

Qual é o futuro da inGaia?

A pretensão da inGaia não é de apenas continuar o crescimento que eles têm no momento, eles querem expandi-lo. As ideias são:

  • Atingir 40% de market share no mercado imobiliário: hoje em dia a inGaia é líder no Brasil com 3x a receita do segundo lugar;
  • Melhorar os resultados das métricas SaaS: o objetivo é medir cada vez mais e ter números ainda melhores;
  • Iniciar a expansão internacional: segundo Mickael, a inGaia não deve em nada para os mercados europeu e americano;
  • Monetização da inteligência de mercado: com tantos dados e transações realizadas, pouca gente conhece tão bem o segmento quanto eles;
  • Crescimento de 100%: de 2017 a 2020 a expectativa é que a inGaia dobre de tamanho.



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