Maternidade e home office em tempos de pandemia
Por Cris Carmo, Consultora de Cultura de Resultados na Superlógica
Algumas pessoas me perguntam como tem sido o home office com criança pequena em casa. Tem sido da mesma maneira que é para todas as mães nessa situação: extremamente desafiador.
As primeiras semanas foram tão difíceis que eu pensei que não daria conta. O Noah tem dois anos e frequenta a escola em período integral desde os 4 meses de idade. Minha rede de apoio sempre foi a escola. Como minha família mora muito longe, tive que contar 100% com ela para conseguir trabalhar.
E agora, com a escolinha fechada, as coisas ficaram muito difíceis! Principalmente porque o Noah ama ir à escola, ver os amigos, as “tias” e fazer “atividades”, como ele mesmo diz. Hoje, com o meu marido também em home office, acabamos tendo que ser o apoio um do outro.
É claro que as dificuldades são muitas, mas esse momento também tem sido de muito aprendizado e tem possibilitado uma montanha de coisas boas. Essas semanas me levaram a uma reflexão mais profunda desse momento e quero compartilhá-la com vocês.
Mas, desde quando a maternidade foi algo tranquilo?
Gestação, parto, puerpério, amamentação, noites sem dormir bem e muitas vezes sem se alimentar bem, além de todas as expectativas de ter um filho saudável e feliz. Superados todos esses desafios, vem a questão: retornar ao trabalho e dar sequência à carreira, ou ser mãe em tempo integral?
Na minha opinião esse é o maior dilema nesse contexto todo, até porque as estatísticas não ajudam. Os dados a seguir nos dão a dimensão da complexidade real que envolve esse tema. 48% das mulheres são demitidas após a licença maternidade, diz um estudo da Fundação Getúlio Vargas.
Em 2019, a MindMiners realizou um estudo chamado Maternidade sem Filtro cujo objetivo foi entender a fundo a visão das mulheres sobre maternidade, conhecer o dia-a-dia das mães e desmistificar os diversos tabus que permeiam o tema. Para isso, entrevistaram 900 mulheres, entre mães e não mães, espalhadas por todo o Brasil, de todas as classes sociais e faixas etárias. O estudo revela alguns dados bem interessantes:
- 79% das mães queriam se ver representadas em um contexto mais real da maternidade;
- 63% gostariam de ver os medos e desafios da maternidade retratados na publicidade;
- 40% disseram querer ver também o lado negativo da maternidade nas propagandas.
O que aprendemos quando nos tornamos mães?
Aprendemos a exercitar a paciência, a resiliência, a empatia, a superação dos limites e do cansaço, o amor verdadeiro. A maternidade nos transforma.
Também aprendemos a empreender. A fundadora da RME – Rede Mulher Empreendedora, Ana Fontes, costuma dizer que “junto com uma mãe nasce quase sempre uma empreendedora”.
Segundo a pesquisa “Empreendedoras e seus Negócios”, da RME, um dos principais motivadores para as mulheres começarem a empreender é a maternidade. De acordo com o estudo, 68% das entrevistadas encontraram no empreendedorismo a saída para conciliar trabalho e as demandas familiares, que aumentam com a chegada dos bebês.
Você já se deu conta de quantas dificuldades precisou superar na sua vida desde que se tornou mãe? No meu caso foram muitas, nenhuma delas eu tinha antes do Noah nascer e vou te contar uma coisa: após o nascimento do meu filho eu fui mais longe do que jamais eu pude imaginar que chegaria. E continuo indo!
A pergunta que não quer calar. Como conciliar home office e filho pequeno em casa?
Não acredito que exista uma receita mágica. Tenho muitas amigas com filhos na mesma idade do Noah, algumas são mães de coleguinhas de escola. Nossos grupos de WhatsApp, antes mais utilizados para marcarmos passeios e churrascos, agora são usados para dividir os desafios e para desabafarmos. A gente se apoia, compartilha como foi a semana, rimos das coisas que não podemos resolver.
Sobre trabalhar em casa e não poder brincar com o Noah o tempo todo, não é simples. Ele sabe que eu estou trabalhando, mas por vezes eu preciso lembrá-lo, dizer que não posso brincar porque estou muito ocupada. Na hora do almoço, quando sentamos à mesa ele me diz todo feliz: “mamãe, agora você não tá trabalhando, né?! Agora eu posso gritar”.
Com crianças maiores você tem outros desafios nesse processo, obviamente. Mas a dependência dos pais costuma ser um pouco menor. Você pode deixar a comida pronta para que eles mesmos a aqueçam, eles vão ao banheiro sozinhos, tendem a entender com mais facilidade a situação como um todo. Com os pequenos não funciona dessa forma, eles demandam muito mais atenção e cuidados.
Precisamos explicar que em alguns momentos não poderemos dar toda a atenção desejada pelos nossos pequenos. O importante é não perder de vista que a criança está na casa dela, no ambiente dela, em que supostamente ela poderia correr, brincar, gritar. Criança saudável e feliz faz barulho mesmo e precisa se sentir livre para fazê-lo em casa, já que não pode ir a outro lugar. A gente precisa ter paciência, muito amor e empatia com nossos filhos.
Outra coisa importante: os pais são tão responsáveis quanto as mães em todo esse cenário. E se não estão ajudando, precisam começar urgentemente! Eu sempre pude contar com o meu marido, e até com o meu sogro, nos cuidados diários do Noah. Trocaram fraldas, deram banho, comida e tudo mais que pede o script. Tudo que nós mães fazemos, eles podem e devem fazer também.
Mas então, como manter uma rotina saudável nesse cenário? Como eu disse inicialmente, não tem receita mágica! O que eu, e todas as mães que conheço, temos feito é tentar encontrar o equilíbrio. Trabalhamos por um certo tempo, paramos por 10 minutos para brincar um pouquinho, dar um lanche, uma olhada no que estão fazendo e voltamos a trabalhar. E para manter a produtividade, ao final da tarde, estendemos um pouco mais o expediente para compensar as pausas feitas durante o dia.
Você sente que está devendo algo?
Nós temos feito muita coisa ao mesmo tempo. Cozinhamos, lavamos, cuidamos da casa, da criança, do cachorro do marido e da gente. A gente se esforça bastante. Uma pessoa muito querida, durante um processo de mentoria me disse: “A gente nunca pode perder de vista que toda pessoa sempre está fazendo o melhor que ela pode fazer”.
Precisamos nos lembrar todos os dias que estamos fazendo o melhor que podemos. Como uma pessoa muito perfeccionista, escrevo isso até para mim mesma, estou fazendo o meu melhor, todos os dias. Sigo superando as dificuldades e aprendendo a fazer isso, dia após dia.
Eu já precisei pedir licença no meio de uma reunião online porque meu filho veio me pedir para levá-lo no banheiro. Ele não faz isso sozinho. Já estive em reuniões de trabalho em que mais ouvia o filho de uma colega ao fundo do que ela mesma. Isso acontece o tempo todo, por isso ou aprendemos a ter empatia agora, por tudo o que temos vivido, ou não aprenderemos nunca.
Na semana passada, uma mãe amiga me mandou uma mensagem, na qual ela relatava os dilemas da sobrecarga de atividades e do medo de expor o filho e sua família ao vírus, já que, por precisar da renda, continua fazendo seu trabalho externo. Na mensagem de áudio, ela ainda disse: “e eu estou muito mal, com a sensação de que todos os dias eu ainda fico devendo algo”.
Isso me fez refletir. Muito. Porque as vezes me sinto assim também. Me lembrei dos dois livros que comprei há 1 mês e que preciso muito ler, pois vão me ajudar no trabalho. Comecei a ler e não consegui continuar. A noite eu preciso dar atenção às coisas da casa, ao meu filho, ao meu marido e acaba que não tenho a mesma disposição de antes para, depois disso tudo, ainda estudar. E aí que a sensação de “estou devendo algo” bate. Mas será que realmente estou?
Sejamos mais gentis com nós mesmas, com nossos filhos, com nossos colegas. A cada dia que passa, é um desafio vencido!
O que mais podemos fazer?
Estamos todas no mesmo barco. Algumas com mais dificuldade e outras com um pouco menos, mas também tentando encontrar uma rotina ideal dentro desse nosso novo cenário.
Eu, particularmente, acredito que o segredo para conseguir fazer isso é a adaptação à realidade que estamos vivendo. Precisamos aceitar que muito do que está acontecendo foge do nosso controle e adaptar nossas rotinas para se encaixarem à nova dinâmica familiar que a pandemia nos trouxe. E o mais importante: o tipo de mindset que se assume diante de toda essa situação.
Pra quem não conhece a palavra, mindset é o seu modo de pensar, que influencia a forma como você encara o mundo, suas decisões, atitudes e, consequentemente, os resultados que você obtém com isso. Se você reagir de uma maneira mais positiva, a probabilidade de resultados melhores é maior.
Em meio a pandemia, tenho certeza de que coisas muito boas também aconteceram. Meu filho sofreu durante muito tempo de APLV (Alergia à Proteína do Leite) e por conta disso a alimentação dele era muito restrita. Misteriosamente a alergia desapareceu e nas últimas semanas ele tem tomado até o leite comum. Eu também fiz o desfralde, com a ajuda do papai.
Fizemos isso na primeira semana do distanciamento social. Foi uma loucura, mas no primeiro dia que deu tudo certo e ele percebeu que eu estava feliz e me perguntou: “Mamãe, agora você está ‘mergulhosa’ do Noah?”. Imagina se não!
E você? Consegue pensar nas coisas boas que tem vivenciado?
Mães superam dificuldades todos os dias. Conciliar home office com filhos pequenos em casa atravessando uma pandemia é mais uma. E vai passar!
Dedico esse texto à todas as minhas amigas e colegas de trabalho, mães com uma carreira, que mais do que nunca estão demonstrando que o mundo é das mulheres.