Analisando precificação e vendas das startups SaaS brasileiras

Por: Heitor Facini8 Minutos de leituraEm 11/12/2017Atualizado em 13/10/2020

Uma das partes mais importantes de qualquer negócio inserido na economia da recorrência é a forma que você vai precificar o seu serviço. É uma tarefa que vai demandar tempo, estudo e análise para ser feita com perfeição.

“No início, ninguém gosta muito de definir ou mudar a precificação”, comentou Diego Gomes, CMO da Rock Content. “Mas é um processo que vai definir o rumo do seu negócio e, se bem feito, vai aumentar o seu faturamento”.

Diego realizou a pesquisa SaaS Landscape Brazil, na qual mapeia a situação das empresas SaaS no país. Ele compartilhou os resultados referentes a precificação e vendas na sua palestra “Analisando precificação e vendas das startups SaaS Brasileiras”, no Superlógica Xperience. Você pode conferí-la completa no vídeo abaixo:

Premissas da precificação

“A primeira coisa que você tem de entender na sua empresa é o modelo de vendas que irá empregar”, destacou Diego Gomes.

O modelo vai variar conforme a quantidade de contato do cliente com a empresa. Você pode escolher entre:

  • Freemium – com avaliação gratuita;
  • Sem contato – o usuário faz a compra sozinho;
  • Inside sales de pouco contato – vendas feitas a distância (via chat ou chamadas de vídeo), mas que requer pouco tempo dos vendedores com os clientes;
  • Inside sales de muito contato – igual o anterior, mas, por ser uma solução mais complexa, requer mais tempo de venda;
  • Vendas de campo – a venda é feita pessoalmente pois o ticket é muito alto e precisa passar segurança;
  • Vendas de campo com engenheiros – além do vendedor estar presente pessoalmente, engenheiros e especialista na solução o acompanham para realizá-la.

Diego apresentou na palestra uma ideia de quanto cada um dos modelos gasta para adquirir clientes.

 

O modelo freemium, por não ter força de vendas investida, gasta menos de R$ 100 para adquirir um cliente. O exemplo citado é o Guiabolso.

O modelo sem contato, por ter pouca força de vendas investida, gasta menos de R$ 200. Diego encaixou a Conta Azul nesse caso.

Em inside sales de pouco contato, você investe mais dinheiro em força de vendas e acaba gastando até R$ 2 mil. A startup Meus Pedidos utiliza esse modelo.

Nova call to action

Com inside sales de muito contato o valor gasto com vendas é maior e o custo de aquisição por cliente (CAC) chega até R$ 8 mil. Ele utilizou o exemplo da própria empresa, a Rock Content, nesse caso.

Em vendas de campo, por conta das viagens, deslocamento e dedicação exclusiva do vendedor com aquele cliente, o custo sobe para até R$ 25 mil. A TOTVS é uma empresa que utiliza esse modelo.

No último caso, em vendas de campo com engenheiros, o custo sobe vertiginosamente, chegando até R$ 75 mil. O exemplo é o da SAP. “Se você tiver o interesse em contratar a SAP, vai receber a visita de 4 engenheiros de terno e gravata para realizar a venda”, apontou Diego.

Dependendo do modelo utilizado pela sua empresa, a responsabilidade de fechar o contrato vai mudar. Se ele está mais à esquerda (modelos com pouco contato), o marketing da sua empresa vai estar encarregado disso. Se ele está mais à direita (muito contato), a responsabilidade está com o time comercial.

Ele exemplificou de como a Rock Content trabalha, o quanto gasta e qual o retorno.

 

A Rock utiliza o modelo de inside sales com muito contato. Isso faz com que o CAC chegue a R$ 4 mil. Da mesma forma, o valor de contrato anual médio está em R$ 18 mil, ou seja, 4,5 vezes maior que CAC.

“Isso não é necessariamente um padrão”, comentou Diego. “Vai variar conforme o serviço que você oferece”.

As melhores práticas na hora de precificar

Diego apresentou duas metas que qualquer empreendedor tem de ter ao implementar uma política de precificação na sua empresa. Ambas dizem respeito às métricas que você terá de medir.

A primeira é: o lifetime value (valor do seu cliente te dá durante todo o período que está na sua empresa) tem de ser pelo menos 3 vezes maior que o CAC. Assim, ele vai valer o investimento feito no início para conquistá-lo. “Se gastou R$ 5 mil para realizar uma venda, você tem de receber pelo menos R$ 15 mil”, exemplificou.

A segunda diz que o tempo para recuperar esse investimento para conseguir o cliente tem de ser de no máximo de 1 ano. “Se eu gasto R$ 10 mil para adquirir um cliente e recebo R$ 8 mil com ele, vou ter problemas lá na frente”.

Essas estimativas são baseadas no mercado norte-americano, que é completamente diferente do brasileiro. Diego aponta que o tempo de recuperação aqui tem de ser bem menor. “No Brasil, o custo do capital é mais alto e você tem menos acesso a ele. O ideal é recuperar esse investimento em menos de 6 meses. Não é uma regra, vai variar de segmento para segmento. Mas é um modelo seguro a seguir”.

Utilize eixos de preços variáveis

A maneira mais simples e comum de cobrar pelos seus serviços é aumentar os preços conforme a funcionalidade que você oferece em cada plano. Isso é um eixo unidirecional de precificação. Ou seja, só há uma forma de avaliar um contrato.

 

A versão básica custa R$ 200 por mês e dá acesso ao pacote básico de funcionalidades. A pro, além das funcionalidades básicas, faz as integrações A, B, C e custa R$ 600. A enterprise, além de tudo que a pro tem direito, dá acesso a API e ao suporte telefônico e custa R$ 1200.

“Existe uma maneira muito mais sofisticada de precificar o seu serviço”, comentou Diego. “Você pode criar outros eixos além das funcionalidades”.

 

Ele criou um segundo eixo de cobrança para o cliente: número de usuários. Para cada novo, é acrescentado R$ 99 no contrato do cliente.

Mas ainda dá para adicionar outra forma de cobrança.

 

Além de cobrar por funcionalidades e número de usuários no sistema, esse modelo cobra por volume de uso. No caso, R$ 100 por GB a mais de armazenamento. “É um exemplo parecido com o que a Salesforce faz cobrando US$ 100 a mais por armazenamento”.

Além disso, ele apresenta outras ideias como: cobrar por tamanho de lista de e-mail, número de clientes e número de funcionários.

Todo mundo ganha com os eixos variáveis

Os eixos variáveis vão ser bom para todo mundo. Os clientes vão se beneficiar pois têm perfis diferentes. Vai existir um cara que vai precisar de muitas funcionalidades mas com poucos usuários e outro com poucas funcionalidades e muitos usuários. Ele vai ser cobrado pelo uso que terá do seu serviço.

O time comercial da sua empresa também vai se beneficiar. Afinal, ele terá várias maneiras de conseguir bater a meta.

Por fim, a empresa como um todo ganha. São várias formas de cobrar e maximizar os contratos dos clientes. Assim, você consegue alcançar um ticket médio mais alto de maneira mais fácil. Para a empresa citada acima, Diego citou 3 maneiras de capturar um ticket médio de R$ 2 mil:

  • Baixa sofisticação técnica, time grande e baixo armazenamento: pacote básico (200) + 16 usuários (16*99) + 2 GB de armazenamento (8*200) = R$ 1.984,00;
  • Média sofisticação, time pequeno e alto armazenamento: pacote intermediário (600) + 4 usuários (4*99) + 10 GB de armazenamento (10*100) = R$ 1.996,00;
  • Alta sofisticação, time e armazenamento pequenos: pacote enterprise (1200) + 4 usuários (4*99) e 4GB de armazenamento(4*100) = R$ 1.996,00.

Qual o panorama da precificação no Brasil?

Diego trouxe alguns números muito interessantes sobre como as empresas SaaS precificam no Brasil. Os dados são do SaaS Landscape e vieram de 400 empresas diferentes.

 

O primeiro mostra o valor do CAC das empresas. Ele está assim:

  • Até R$ 100 – 23,2%;
  • Entre R$ 100 e R$ 200 – 8,4%;
  • Entre R$ 250 e R$ 500 – 17,2%;
  • Entre R$ 500 e R$ 1000 – 9,4%;
  • Entre R$ 1 mil e R$ 5 mil – 19,7%;
  • Entre R$ 5 mil e R$ 50 mil – 4,9%;
  • Entre R$ 50 e R$ 10 mil – 2,5%;
  • Não mensuram/não sabe – 14,8%.

A principal descoberta desse dado é que 58% das empresas gastam até R$ 1 mil para adquirir o cliente. “Não consegui entender diretamente o motivo disso”, explicou Diego. “Mas tenho duas suposições: ou é pelo modelo de pouco contato nas vendas ou pelo conservadorismo em marketing e vendas”.

 

Ele mostra quanto tempo demora para as empresas recuperarem os investimentos para conseguir os clientes. “Se investe R$ 2 mil reais em marketing, R$ 2,5 mil em vendas e o teu cliente paga R$ 1 mil por mês, você leva 5 meses para recuperar o CAC”, exemplificou.

Os resultados são:

  • Até 3 meses – 24,1%;
  • Entre 3 e 6 meses – 36,2%;
  • Entre 6 e 12 meses  – 34,5%;
  • Não mensuram/não sabe – 5,2%.

“É bom ver que a maioria das empresas está entrando na regra citada”, apontou Diego. “Mais de 60% das empresas recupera o CAC em menos de 6 meses”.

Outro dado que Diego trouxe é o valor médio do contrato anual de cada cliente das empresas.

 

De acordo com o levantamento, os contratos médios estão divididos em:

  • Até R$ 5 mil – 50,7%;
  • Entre R$ 5 mil e R$ 15 mil – 17,2%;
  • Entre R$ 15 mil e R$ 25 mil – 5,4%;
  • Entre R$ 25 mil e R$ 50 mil – 10,3%;
  • Entre R$ 50 mil e R$ 100 mil – 6,4%;
  • Entre R$ 100 mil e R$ 250 mil – 6,4%;
  • Acima de R$ 250 mil – 3,4%.

“Esse valor por si só não diz muito”, explicou. “O número tem de ser acompanhado com outros para fazer sentido”.

Por isso, ele trouxe o comparativo de onde vem esses contratos e achou que:

 

Em clientes com até 50 funcionários, o valor médio do contrato anual era de até R$ 5 mil; para clientes entre 50 e 200 funcionários, o valor era entre R$ 15 mil e 20 mil; para mais de 200 funcionários, entre R$ 50 mil e 100 mil. “Assim você consegue entender se deveria receber mais ou menos do seu cliente conforme o número de funcionários dele”.

Os respondentes da pesquisa também avaliaram qual é a principal métrica utilizada para variar os preços.

 

A maioria (53,2%) utiliza o número de funcionários para a variação. Em seguida vem volume de uso (12,3%), tamanho da base de dados (8,9%), número de transações (8,4%) e número de funcionalidades (3%). 14,3% cobra de outras formas.

Por fim, eles também mediram a proporção entre o lifetime value e o CAC.

 

Os dados obtidos foram:

  • Até 2x – 10,3%;
  • Entre 2x e 2,5x – 7,7%;
  • Entre 2,5x e 3x – 12,8%;
  • Entre 3x e 4x – 17,9%;
  • Entre 4x e 5x – 7,7%;
  • Maior que 5x – 43,6%.

O mercado brasileiro de SaaS é muito saudável quanto à obtenção de clientes”, opinou Diego. “Quase 70% das empresas está de acordo com a regra de ter o LTV pelo menos 3x maior que o CAC”.

Exemplos de precificação no Brasil

Diego também trouxe para a palestra exemplos de empresas que precifica no Brasil e quais eixos elas usam.

O Superlógica Assinaturas tem eixos por funcionalidades e por número de clientes. O primeiro tem 3 planos: Startup (R$ 229,90 ao mês), Basic (R$ 279,90) e Pro (R$ 379,90).

A partir do plano Basic, você pode escolher o número de clientes ativos na sua base. Por exemplo, o plano basic tem 5 faixas com 5 preços diferentes. Acima dessas faixas, o preço deve ser consultado com a equipe comercial.

Para chegar a um ticket médio de R$ 700 você pode usar um plano médio com 500 clientes por R$ 749,90 ou um plano avançado com 250 por R$ 699.

Na Meus Pedidos, existem dois eixos de cobrança.

 

O primeiro está relacionado as funcionalidades do sistema. São 3 planos: o bronze custa R$ 39, o prata custa R$ 59 e o ouro custa R$ 89. Eles também realizam a cobrança por usuário no sistemas. Esses valores são por usuário no sistema, ou seja, se tiver 2 usuários no plano prata, ele vai custar R$ 118.

Você consegue um ticket médio de aproximadamente R$ 450 de 3 maneiras: 12 usuários no plano bronze por R$ 468; 8 no plano médio por R$ 473; e 5 no avançado por  R$ 455.

A Resultados Digitais também vende o RD Station em 2 eixos.

 

O primeiro é o das funcionalidades. O plano Basic custa R$ 329, o Pro custa R$ 679 e o Enterprise custa R$ 1.790. O segundo eixo está relacionado ao número de leads que você vai gerenciar no sistema. Por exemplo, no plano Pro você pode escolher entre até 5 mil leads, R$ 679, até 200 mil, R$ 3.739. A diferença fica em R$ 3.060.

Regras de ouro para precificação e vendas em SaaS

Para finalizar a palestra, Diego deu 6 dicas na hora de precificar um serviço SaaS. São elas:

  1. Defina sua métrica estrela guia e cobre a partir dela: o usuário vai entender valor naquilo que ele está pagando;
  2. Na hora de começar, analise a concorrência: veja como empresas no Brasil e mundo estão fazendo precificação para ter insights no seu serviço;
  3. Mostre que o cliente está ganhando dinheiro ao fechar com você: ele tem de perceber que você traz menos gastos que um serviço similar;
  4. Use eixos variáveis de precificação: é a melhor maneira de você conseguir maximizar o seu ticket médio e mostrar valor ao cliente;
  5. Recupere o CAC em menos de 6 meses: é um dos primeiros sinais que a sua empresa está pronta para escalar;
  6. Experimente: por fim, apenas testes vão dizer a melhor maneira de precificar o seu serviço.




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