Crise: gerenciando em tempos interessantes
Por Alexandre N. Rodrigues, COO do grupo Superlógica, com larga experiência na liderança de negócios digitais e tradicionais, como empreendedor, executivo e consultor em empresas como: 3M, Bosch e Takeda Pharma entre outras.
“Que você viva em tempos interessantes”. A frase, conhecida como a maldição chinesa, define tempos interessantes como aqueles em que há uma ruptura da rotina e da ordem estabelecida, resultando em desafios inesperados. Tempos de crise!
Sob essa perspectiva podemos dizer que estamos vivendo em tempos interessantíssimos: uma pandemia assolando o mundo, expectativa de impactos econômicos que ainda não sabemos o tamanho e resultando numa recessão global, acirramento das disputas políticas, novas tecnologias alterando profundamente a forma como vivemos e por aí vai.
O foco desse artigo está no que empreendedores e executivos podem fazer, nesse momento, para gerenciar seu negócio. E, sim, é possível realizar ações muito efetivas em tempos turbulentos (como definiu Peter Drucker) e sair mais forte da crise do que quando entrou.
O que preciso fazer em momentos como esse?
Em tempos de grandes incertezas toda organização, seja grande ou muito pequena, precisa ser capaz de fazer duas coisas:
- Resistir a golpes imprevistos
- Identificar e avaliar oportunidades inesperadas
Mas como fazer isso?
Antes de mais nada, é fundamental você ter dinheiro para pagar suas despesas, ou seja, gerenciar suas finanças de maneira a garantir liquidez. É preciso dinheiro disponível para sobreviver alguns meses com receitas reduzidas e margens de lucro menores ou negativas.
Toda crise, do ponto de vista financeiro, é uma crise de confiança. Seja lá qual for a causa da falta de confiança: uma pandemia, suspeitas de que devedores não serão capazes de honrar suas dívidas, por exemplo. E quando há falta de confiança as pessoas reduzem o consumo, os bancos cortam as linhas de crédito e fica caro e difícil conseguir empréstimos. Às vezes impossível.
Em momentos como esse, as empresas e pessoas que possuem um belo patrimônio (ativos), mas com pouca liquidez (ou seja, não conseguem transformar seus ativos em dinheiro para pagar suas contas) correm um risco grande de quebrar. Aliás, essa é uma das principais razões de falências e concordatas em momentos de crise.
Prioridade 1: O caixa é rei
Então, a lição número um é: em momentos de crise, o caixa da empresa é rei. Você deve concentrar suas energias nesse ponto. Para isso:
- Renegocie contratos;
- Alongue pagamentos;
- Postergue investimentos;
- Considere tomar dinheiro emprestado se tiver acesso a crédito com juros baixos (isso não é fácil no Brasil).
- Corte despesas não essenciais;
- Aloque eventuais investimentos financeiros em aplicações conservadoras, pois não é hora de fazer apostas arriscadas;
- Tem dívidas em outra moeda, como o dólar? Faça o hedge cambial para se proteger.
É nessa hora que quem tem uma reserva, quem conseguiu poupar um pouco, vai estar numa condição privilegiada. Não conseguiu? Lembre-se disso daqui prá frente, outras crises virão.
Resumindo: foque em ter dinheiro disponível para pagar as contas.
Prioridade 2: Fazer mais com menos
Em seguida, sua prioridade será gerenciar a produtividade como nunca. E produtividade aqui quer dizer “fazer mais com menos recursos”, reduzir desperdícios, conseguir que cada pessoa, cada equipamento, cada recurso seja utilizado da melhor forma e de maneira a gerar o máximo de resultado, que seja possível fazer mais com menos.
E como dizia meu primeiro chefe, um diretor de manufatura calejado: “Cortar custos é como cortar unhas, elas crescem e você sempre terá que cortar”. Basta olhar para sua operação com olhos de visitante e você verá oportunidades de cortar desperdícios com:
2.1 Desperdícios com pessoal
Pessoas trabalhando em projetos pouco importantes, com pouca habilidade para o que deve ser feito, aguardando instruções, esperando materiais, sem equipamento ou com equipamentos ruins para trabalhar, pessoal desmotivado, desperdícios de tempo devido a deslocamentos desnecessários, entre outras.
2.2. Desperdícios com equipamentos
Operando abaixo da velocidade ideal; perdendo tempo parado devido a quebras e set-ups prolongados, equipamentos desgastados com baixo rendimento, retrabalhos em peças defeituosas ou computadores rodando rotinas que tiveram falhas, por exemplo.
2.3. Desperdícios de outros recursos
Matéria prima mal aproveitada; gastos excessivos com energia, água e materiais consumíveis, gastos com publicidade não efetiva, para citar alguns.
Importante lembrar que os trabalhadores do conhecimento são potencialmente mais produtivos porém mais caros. E são a maioria em uma empresa de tecnologia. Aqui os gestores devem saber em que tarefas cada um está alocado e garantir que as principais forças de cada um sejam empregadas nos projetos com maiores retornos no curto prazo e nas oportunidades de altíssima prioridade para o futuro.
Prioridade 3: Custos Futuros
Em períodos de crise, é possível que haja choques na oferta/demanda e eventualmente inflação de seus custos. Então, é fundamental que você ganhe, hoje, o suficiente para cobrir os custos futuros que poderão estar inflacionados em relação aos custos atuais ou aos custos de reposição de seu estoque, caso seja uma operação industrial ou comercial.
Um negócio que não ganha o suficiente para cobrir os custos futuros de sua operação está destinado a encolher e fechar. Simples assim!
A lógica econômica implica em comprometer recursos financeiros hoje, para colher com lucro amanhã e assim sucessivamente. Se a “colheita” te permite cobrir os custos passados, mas não é suficiente para capturar ganhos e fazer a roda girar novamente, então a lógica econômica se quebra.
Traduzindo, você fica com a ilusão de que teve lucro, mas não consegue manter o mesmo nível de atividades e ganhos na próxima rodada.
Prioridade 4: Gerenciando para o futuro
Os pontos acima são fundamentais para o negócio sobreviver. Se eles estiverem nos trilhos, é hora de pensar no futuro. E quem fez a lição de casa pode pensar em sair mais forte do que entrou na crise.
4.1. Novas Oportunidades
Você já deve ter ouvido falar que para os chineses (olha a sabedoria milenar aqui novamente, independente da ideologia) crise e oportunidade são duas faces da mesma moeda. E é verdade.
Toda crise traz oportunidades que sentidos aguçados serão capazes de enxergar e quem estiver preparado vai se beneficiar disso. Não estou falando aqui de se aproveitar da tragédia alheia e vender álcool gel a preços abusivos. Sim, isso acontece e deve ser reprimido, mas falo de oportunidades que surgem devido às dificuldades impostas pela crise e que, ao serem endereçadas, podem ajudar muita gente e beneficiar quem está bem posicionado para resolvê-las.
Neste momento há donos de restaurantes criando cardápios para delivery, empresas se adaptando ao home office de maneira como nunca pensaram e que resultará na quebra de paradigma sobre contratar e manter talentos em outras localidades e na redução de custos operacionais, pois perceberão que podem gastar menos com seus escritórios. Possivelmente, veremos a evolução de serviços prestados remotamente, assim como o crescimento de sua aceitação: cursos e educação à distância me parecem óbvios.
O ponto aqui: Fique atento às novas oportunidades, esteja preparado para avaliar rapidamente e concentrar esforços apenas nas mais promissoras.
4.2. Revisão das prioridades
Por outro lado, é hora de revisar suas prioridades. Algo que fazia todo sentido há uma semana talvez não seja tão relevante nesse momento. Após um período de estabilidade é comum que tenhamos iniciativas e projetos que seguimos tocando mesmo que os resultados não apareçam. É hora de dar um chacoalhão nisso.
É verdade que aqui no Brasil nós estávamos no processo de recuperação de uma crise importante, mas o período atual está muito mais turbulento. Sente, junte o time, avalie as prioridades de cada área e veja se fazem sentido nesse momento. Você precisa concentrar recursos onde vai colher resultados. Lembre-se, normalmente o desafio não é ter boas ideias, mas ter foco.
Em suma: Reveja suas prioridades, tenha foco e diga não para outras iniciativas legais que estejam desalinhadas. É chato, mas é o que deve ser feito.
Finalmente, é importante manter a cabeça no lugar, trabalhar seu controle emocional e manter uma atitude positiva. Essa não será a primeira nem a última crise que a humanidade terá vivido.
Como diz o ditado: Mar calmo nunca forjou bons marinheiros. Sairemos dessa crise mais fortes, como profissionais e como pessoas.
Sobre o autor
Alexandre N. Rodrigues, COO do grupo Superlógica, possui larga experiência na liderança de negócios digitais e tradicionais e atualmente faz parte do Board executivo do PJBank e da Superlógica Tecnologias.
Atuou como consultor em transformação digital, planejamento estratégico e gestão da inovação para empresas como Takeda Pharma, Bosch e Quatá Alimentos e Centro da Memória da Eletricidade, da Eletrobrás.
Foi executivo da 3M responsável por Unidades de Negócios Aeroespacial, Naval e Ferroviária, inclusive com experiência na manufatura e COMEX.
Possui experiência internacional desenvolvida em viagens de negócios e liderança de projetos, planejamentos estratégicos globais e treinamentos.
Sobre a Superlógica
A Superlógica desenvolve o software de gestão líder do mercado brasileiro para empresas de serviço recorrente. Somos referência em economia da recorrência e atuamos nos mercados de SaaS e Assinaturas, Condomínios, Imobiliárias, Escolas e Cursos.